Um tempo atrás, atendendo um paciente, escutava seu sofrimento sobre o trabalho na ocasião. Como muitos imigrantes, para subsistir em outro país, ele atuava no que costumamos chamar de “subemprego” – um termo um tanto pejorativo aliás, não é? Ele era atendente de SAC, muitas horas ao telefone, só recebendo reclamações, sob regras rígidas e pressão constante. Algo que muitos imigrantes suportam para se manterem em um país estrangeiro.
Mas uma frase que ele disse me paralisou: do outro lado da linha, alguém gritava descontroladamente: “Não quero falar com você, quero alguém que fale a minha língua (sendo que ambos falavam o mesmo idioma)! Volte para seu país!”. A raiva e o preconceito eram palpáveis.
Fiquei sem ar.
Já tinha ouvido sobre as dificuldades nesse tipo de trabalho, mas nunca algo tão cru.
Algo parecia se romper dentro dele à medida que me contava. Era como se toda a esperança e qualquer razão para estar ali fossem se desintegrando na minha frente. E, embora eu mesma já tivesse sofrido preconceitos em outro país, essa forma de ódio, essa xenofobia explícita, que aniquilava o outro, era nova para mim. Que dizer? Como agir?
Então isso que acontecia na minha frente, me fez refletir: de onde vem isso? Como abordar tal violência sem vitimizar ainda mais a vítima, e sem cair na mesma lógica de aniquilamento de quem agride?
Naquele momento busquei preservar meu papel profissional, acolhendo de todas as formas que pude, quase chorando junto (era como eu estava por dentro). Depois, refleti sobre o fenômeno.
Só hoje, muito tempo depois, neste projeto TEP, que busca atender imigrantes pelo mundo, e como terapeuta de casal e família, comecei a pensar naquilo: no que haviam feito com ele, onde ele foi atingido, onde eu havia sido afetada por sua fala e sentimentos, e por que eu, em uma experiência similar, senti preconceito, mas não xenofobia?
As próximas linhas poderão soar polêmicas, mas comecei a ver a xenofobia como um fenômeno relacional, de mão dupla. Afinal, o mundo está cada vez mais cheio de imigrantes, e me parece crucial pensar não só em como se sente quem chega, mas também em como pode ser saudável para todos se considerarmos igualmente quem precisa “receber” aquele que vem de fora, não é mesmo?
Pensem comigo: quem gosta de se sentir “invadido”? Quando um grupo não convidado entra em nossa casa e ela começa a deixar de ser “nossa”, tornando-se mais parecida com a deles, pegando-nos desprevenidos, que sentimento isso provoca?
Acredito na liberdade de ir e vir, contudo, tenho começado a pensar que, coletivamente, como sociedade, andamos fracassando em cuidar dos lugares, especialmente dos que visitamos ou para onde imigramos.
Frequentemente falhamos nas formas de nos integrar e de respeitar os costumes locais. E, a partir desses comportamentos, surgem “bolhas” culturais que, às vezes, fazem o próprio nativo se sentir um forasteiro. Não é importante refletirmos sobre isso?
A xenofobia é terrível, um medo descontrolado do desconhecido, uma aversão ao diferente. Mas ela não surge sem um contexto, sem uma experiência prévia, mesmo que percebida como negativa, com esse “estranho”. Essa “expulsão” do desconhecido me provocou pensar nessa “invasão” que mencionei, na ideia de que pessoas, por simplesmente remeterem a uma experiência hostil vivida por alguém, parece que querem eliminar os outros do mapa.
Cuidar do imigrante, portanto, é cuidar das relações sociais no país onde ele vive. É preservar o lugar de todos nessas interações, promovendo um convívio mais harmônico e respeitoso.
Se você é imigrante e sente o peso dessa jornada…
… cheia de desafios que podem abalar sua identidade, senso de pertencimento e autoestima, fazendo você se sentir invisível ou desvalorizado. Se você enfrenta essas dificuldades ao buscar seu lugar no novo país, queremos que saiba que você não precisa passar por isso sozinho. Nós, da TEP, entendemos essas nuances e oferecemos um espaço seguro para acolher suas emoções, ressignificar vivências e reconstruir sua força interna. Sua jornada importa, e estamos aqui para te acompanhar em todo o processo para que você encontre seu lugar onde estiver.